QUEDA DE BRAÇO ENTRE ASSEMBLEIA E GOVERNO DE MG

Por Dr. Wilson Campos
O pior da política brasileira tem ocorrido em Brasília. O pior da política mineira está acontecendo em Belo Horizonte. O despreparo dos políticos atuais é tão grande que eles colocam problemas pessoais acima dos interesses da população.
Vejamos o caso recente de Minas Gerais e mais precisamente o entrevero entre o presidente da Assembleia Legislativa e o Governador:
O primeiro insinuou, segundo divulgado pela imprensa, que o segundo pretende fazer uso político do Projeto de Lei 2.508/2021, que trata de proposta que define o destino de R$11 bilhões, dos R$37,7 bilhões pagos pela empresa Vale como compensação pela tragédia de Brumadinho, em janeiro de 2019.
Sem tomar partido de um ou outro, o certo é que o texto inicial prevê distribuição aos 853 municípios de 30% dos recursos da multa imposta à mineradora. O saldo do montante, algo em torno de R$ 26,7 bilhões, ficará reservado para reparação direta aos atingidos pelo rompimento devastador da barragem.
No meio da tantos problemas sérios vividos pelos mineiros, eis que surgem picuinhas desnecessárias, meramente trazidas pela politicagem, com repiques de acusações, recados ríspidos por meio dos jornais, mensagens agressivas pelo Twitter e outras formas deselegantes de tratamento. As provocações são quase diárias e envolvem representantes do Legislativo e do
Executivo mineiros, que digladiam em público, sem pestanejar.
A Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) cobra que o Executivo estadual encaminhe um substitutivo ao Projeto de Lei 2.508/2021 o quanto antes. Mas a pirraça de ambos os lados provoca um impasse, que reside exatamente na forma de repasse de R$ 1,5 bilhão da verba que, conforme alegação da Assembleia, deputados e representantes do governo haviam acordado em relação à distribuição da quantia, que se efetivaria por meio de depósitos feitos diretamente na conta dos municípios, proporcionalmente à população de cada um.
Já o governo de Minas quer que os repasses sejam realizados na modalidade de convênio. Ou seja, um quer de um jeito e o outro quer de outra forma. O jogo de empurra é grande e parece não ter fim. A novela política se arrasta. E enquanto isso, os municípios vão adiando os investimentos que poderiam ter sido revertidos em prol de suas respectivas populações.
As alegações de parte a parte são prejudiciais ao povo mineiro. Se é burocrático demais para um e se as cidades estão trabalhando no vermelho para o outro, a solução deveria ser sentar à mesa e agir como os velhos políticos mineiros, que deixaram lições preciosas de como contornar os problemas quando tudo parecia perdido para os lados antagonistas. Em tempos de sofrimento com desemprego, economia cambaleante, pouca renda e dificuldades de todo tipo, em razão da demorada e extenuante pandemia da Covid-19, a melhor solução é dialogar, dialogar e dialogar, no velho estilo mineiro.
Mas, ao que parece, a coisa tende a piorar, uma vez que os dois lados batem cabeça e não procuram pelo entendimento em benefício do povo mineiro, lamentavelmente.
Note-se que a imprensa deu grande destaque ao fato de o Presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o deputado estadual Agostinho Patrus (PV) atacar o secretário-geral do governo de Minas, Mateus Simões, há poucos dias.
O parlamentar fez a declaração em relação a uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) proposta pela ALMG, vista pela Casa como solução para destravar a destinação de recursos do acordo da Vale. “A ALMG vai votar a PEC da Vale, e não será um ex-vereador de meio mandato, inexperiente, ignorantee muito presunçoso que vai nos dizer o que fazer”, publicou o deputado nas redes sociais.
Por seu lado, o secretário-geral do Governo de Minas afirmou que a administração estadual nunca enviou projeto substitutivo ao Projeto de Lei 2.508, que regulamenta a utilização dos R$ 11 bilhões da Vale. O texto tramita na Assembleia Legislativa.
O resultado desse imbróglio, até o momento, é que a ALMG aprovou nesta terça-feira, 6 de julho, em 1º turno, a PEC 68/2021 que autoriza o repasse direto aos municípios dos recursos suplementares do Estado. A aprovação por 70 votos a 3 (e um em branco) da PEC, que ocorreu em um clima bastante tenso, muda a destinação dos cerca de R$ 11,06 bilhões provenientes do acordo judicial da Vale para indenização do desastre de Brumadinho.
Com a aprovação do texto, os recursos serão repassados diretamente aos 853 municípios, diferentemente do que defendia o governo Zema, que pretendia que o dinheiro fosse repassado aos municípios por meio da celebração de acordos entre os executivos estadual e municipais.
A votação, como dito, ocorreu com forte troca de acusações entre deputados da base do governo e de oposição. As acusações vão no sentido de que o problema da PEC, além do caráter eleitoral, é que ela vai contra uma determinação judicial transitada em julgado. Ou seja, além do antagonismo político surge uma provável demanda judicial, que poderá atrasar ainda mais o repasse das verbas aos municípios mineiros. Ademais, fazer uso político da verba numa hora grave dessa, de muitos dissabores por todos os lados, torna-se inaceitável.
Resta aos dois lados pensar mais nos habitantes dos municípios, independentemente de desentendimentos político-partidários. Ora, o dinheiro é para ser usado em benefício das pessoas. Portanto, cumpra-se.
Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas tributária, cível, trabalhista, empresarial e ambiental/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).
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